OSORIO, Luis Camilo. Diálogo Enviesado com a Estética do Barroco Azulejões: Adriana Varejão volta com força ao Rio In: O Globo, 2006.

“Azulejões” é o título da exposição de Adriana Varejão no CCBB. Ele descreve bem o que será visto: uma seqüência de pinturas, óleo sobre gesso e tela, que se desdobra em uma instalação, ou melhor, em uma enorme arquitetura virtual de azulejos. O virtual aí fica por conta de que tudo se insinua mas nada é o que parece; não é nem azulejo, nem arquitetura. Neste jogo entre vertigem e ilusão surge um diálogo enviesado com a estética do barroco.

Varejão há muito tempo não se apresentava individualmente no Rio. Sua carreira, seguindo a de alguns outros nomes da sua geração, mal começara a despontar e já se voltava para a cena internacional. Daí uma certa expectativa rondava esta mostra: será que ela vai corresponder aqui ao que se fala dela lá fora? Mesmo sendo um único trabalho, tem força suficiente para marcar sua volta à cidade. Duas características impressionam de imediato: a técnica e o apelo decorativo. Ambas, como sabemos, rejeitadas sistematicamente pela arte contemporânea. A artista consegue repô-las em foco sem deixar de lado seu interesse pelo presente. Há uma excitação sensorial que é muito da nossa época. Seus “azulejos” tomam de assalto o espaço.

A primeira reação do espectador é certamente o deslumbre. Do chão todo branco, levanta-se uma onda impactante de “azulejos”. Em seguida, começamos a nos perguntar: mas como isso é feito? E essa pergunta permanence até o fim. O permanecer da dúvida é a qualidade artística da técnica. Como ela consegue o quebradiço? Como ter controle sobre a atuação do tempo? Que química é essa?

obra seduz o mais distraído dos espectadores

Quanto à qualidade decorativa desta pintura/ instalação, devemos analisá-la tendo em vista alguns de seus trabalhos anteriores, onde o elemento sensorial vinha sempre com um tom de estranhamento – pedaços de “carne” saíam de dentro das telas. Aqui não; e este destemor diante do belo deve ser visto como uma pergunta sobre o seu lugar na arte contemporânea. O diálogo com a tradição — com a azulejaria, com a pintura, com o belo - não a impede de seduzir até o mais distraído dos espectadores.

Um aspecto de sua contemporaneidade diz respeito ao modo como o passado se apresenta sem uma dimensão histórica sedimentada; ou seja, à revelia das suas motivações, trata-se de expor um passado esterilizado, sem tempo e sem exemplaridade, que expressa o próprio fim de uma certa idéia de História. Isso tudo é vivido sem dor ou nostalgia, muito pelo contrário: a graça é umas das maiores qualidades desta instalação.